Eu penso que diversos elementos textuais e contextuais apontam para o uso de uma figura de linguagem, especificamente, uma hipérbole mesmo. Vou fazer três considerações aqui:
Em primeiro lugar, Paulo, ao introduzir o capítulo sobre o amor, utiliza uma série de afirmações hipotéticas no modo subjuntivo do grego, o que indica situações contrárias à realidade, apenas concebíveis, e não necessariamente verdadeiras. Assim como ele fala, nos versículos seguintes, sobre conhecer todos os mistérios e toda a ciência, ou sobre doar todos os seus bens e entregar o corpo para ser queimado, exageros retóricos que ressaltam a supremacia do amor, também a menção às “línguas dos anjos” serve como um exemplo extremo para destacar a futilidade de dons espirituais quando exercidos sem amor.
Em segundo lugar, mesmo se alguém insistir em tomar a frase de forma literal, isso não apoiaria a noção de que essas línguas seriam ininteligíveis ou extáticas, pois em todas as ocorrências bíblicas onde anjos se comunicam com seres humanos, a comunicação ocorre em idiomas humanos claros e compreensíveis (cf. Gn 18-19; Js 5:13-15; Lc 1:11-37).
Por último, penso que os anjos, como seres espirituais, não possuem uma linguagem sonora natural como os humanos; sua comunicação, na esfera celestial, é provavelmente direta e imaterial, um intercâmbio de pensamento, não de sons audíveis materiais. Portanto falar em línguas bíblico, mesmo se entendido como línguas angelicais, ainda se manifestaria línguas humanas reais, conhecíveis e inteligíveis, não como algaravias extáticas.