Um dos modos de refletirmos racionalmente sobre a natureza de Deus é a partir do conceito de Deus como o maior ser concebível, isto é, um ser que possui todas as perfeições em grau máximo. Essa abordagem, popularizada por Anselmo de Cantuária e por pensadores como Alvin Plantinga, nos permite investigar quais atributos seriam logicamente exigidos pela natureza de Deus.
Uma dessas perfeições é a perfeição moral. Um ser moralmente perfeito é necessariamente justo, bom, fiel e, não menos importante, amoroso. O amor, portanto, faz parte da essência da perfeição moral e, por consequência, da própria natureza divina.
No entanto, o amor, por sua própria definição, é relacional. Ele implica a doação de si em prol de outrem. Amor não é uma virtude autocentrada; ele requer um “outro” para ser plenamente exercido. Amor implica comunicação, entrega, comunhão e reciprocidade.
Ora, se Deus é essencialmente amoroso, isso significa que, mesmo antes de criar o mundo ou qualquer criatura, Ele já exercia amor em sua plenitude. Mas aqui surge um problema para formas unitárias de teísmo, como o unitarismo ou o islamismo: se Deus é uma única pessoa solitária, então antes da criação não havia ninguém a quem amar. Isso implicaria que Deus não exercia amor até o momento da criação, tornando o amor uma característica contingente, algo que Ele só passou a exercer depois de criar outros seres.
Contudo, essa conclusão é inaceitável para um teísmo que sustente a perfeição de Deus. Deus não pode adquirir qualidades morais ao longo do tempo ou tornar-se amoroso apenas após criar. Se Ele é eternamente perfeito, Ele deve ser eternamente amoroso.
Esse “outro” a quem Deus ama não pode ser uma criatura, pois a criação é fruto de uma decisão livre de Deus, não de Sua essência. Deus poderia, sem perda de perfeição, ter escolhido não criar nada. Mas Ele não poderia deixar de ser amoroso, pois isso comprometeria Sua perfeição moral.
A única explicação plausível, portanto, é que Deus não é uma pessoa solitária, mas uma comunhão de pessoas. A doutrina da Trindade afirma exatamente isso: há um único Deus em essência, mas existindo eternamente como três pessoas distintas, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, em perfeita e eterna comunhão de amor. Portanto esse “outro” a quem Deus ama é interno ao próprio Deus.
A Trindade, portanto, não é um capricho doutrinário, mas uma conclusão profundamente coerente com a ideia de Deus como o maior ser concebível. Ela explica como Deus pode ser eternamente amoroso de forma relacional, sem depender de nada fora de Si mesmo.
Em contraste, formas unitárias de teísmo fracassam nesse ponto. Um Deus que só pode amar após criar não é o maior ser concebível, pois sua moralidade amorosa é contingente e limitada. Apenas o Deus trinitário pode ser descrito como plenamente e eternamente perfeito em amor.
Esse argumento não prova que há três pessoas em Deus, mas demonstra que essa doutrina é plausível e preferível a formas unitárias de teísmo.